domingo, 21 de dezembro de 2014

Uma foto histórica - autor: Bortolo Achutti

Em 30 de junho de 1985, o Centro de Tecnologia da UFSM completou 25 anos de fundação. Organizei, na época, uma exposição comemorativa, no saguão de Centro de Tecnologia, com fotos, documentos e instrumentos.
A coleta de documentos e, principalmente, de fotografias exigiu uma laboriosa busca em vários setores da Universidade.
Uma das fotos expostas tem grande valor histórico para o Centro de Tecnologia e para a UFSM.
Não sei em que dia foi tomada, mas eu a denominei

O “Dia do sim”
No ano de 1958, o Prof. José Mariano da Rocha Filho, então presidente da ASPES-Associação Santa-Mariense Pró-Ensino Superior, insistentemente solicitou a Evaldo Behr a doação de uma área em Camobi para a instalação do projeto urbanístico do Centro Politécnico de Santa Maria, origem do atual Centro de Tecnologia. Essa instituição comporia o setor tecnológico da universidade que o Prof. Mariano sonhava criar.
Evaldo Behr, além de ele próprio, representava seu sogro, Alfredo Tonetto, seu cunhado, Arlindo Tonetto, e seu irmão Edmar Behr, todos proprietários, em área ideal, de terras em Camobi, correspondentes hoje a boa parte do campus da UFSM.
Jan./fev.1959 - Evaldo Behr (E) mostra ao Dep. Tarso Dutra e ao Prof. Mariano da Rocha o início da área a ser doada à ASPES para o Centro Politécnico de Santa Maria, embrião do atual campus da UFSM. Foto: Bortolo Achutti

Passado algum tempo, Evaldo Behr convenceu os demais coproprietários a realizarem a doação. Como ele próprio me disse, em entrevista, estava com seu irmão empreendendo loteamentos e previa que o Centro Politécnico, na área a ser doada, resultaria em considerável valorização de suas terras, então distantes cerca de 900 metros da rodovia, porque se tornariam lindeiras da nova instituição de ensino superior.
O deputado federal Tarso Dutra, amigo e compadre do Prof. Mariano, já havia obtido dotações orçamentárias para iniciar as obras do Centro Politécnico, para o qual ainda não havia uma área e, obviamente, projeto.
Num dia de verão, entre janeiro e fevereiro de 1959, Mariano da Rocha e Tarso Dutra visitaram Evaldo Behr em sua casa de Camobi, junto a uma piscina comunitária. Sentados na varanda da casa, compartilhando o chimarrão, Behr comunicou aos visitantes que ele e os demais proprietários concordavam em fazer a doação, desde que a área fosse por ele demarcada.
Levantaram-se então, levando chaleira e cuia, e andaram cento e poucos metros até uma posição nas proximidades do atual pórtico de entrada do campus. Evaldo Behr descreveu então uma área, a partir daquele local, na direção sul, em forma de “L”, que o posterior levantamento topográfico revelou ter 36,68 hectares. O ramo maior corresponde hoje à Av. Roraima e seu entorno de edificações, em ambos os lados.

Intrigava-me o fato de a imagem daquele decisivo momento ter sido perpetuada em uma fotografia. Em entrevista a mim concedida pelo Prof. Mariano, em sua residência, quando eu buscava dados para o Histórico do Centro de Tecnologia, publicado em 1990, perguntei-lhe como isso ocorrera. Ele disse que, por telefone, fora informado por Behr da possibilidade da doação. Dirigiu-se então a Camobi, acompanhado de Tarso Dutra e Bortolo Achutti, fotógrafo lotado no Curso de Medicina, então vinculado à UFRGS.
30.7.1959 - Arquiteto Oscar Valdetaro, da Fomisa/RJ, expõe a Mariano da Rocha e a Evaldo Behr sua  primeira concepção de projeto. A avenida principal na divisa oeste, serviria também às terras dos doadores. Os dois blocos de edifícios visíveis tinham a orientação solar correta: Norte-sul. Foto possiv. de Bortolo Achutti

Muitas outras fotos da época, referentes às ações da ASPES e aos cursos de Medicina e de Farmácia, devem ser de autoria de Bortolo Achutti, sem terem o crédito registrado.
Quanto à foto do “Dia do sim” não há dúvida, foi tirada por Achutti porque isso foi declarado pelo Prof. José Mariano da Rocha Filho.
A foto registra o momento histórico em que foi concedida a doação da área destinada ao Centro Politécnico de Santa Maria, quase um ano antes de ser criada a UFSM. Com seus 36,68 hectares, foi o embrião dos cerca de 1.800 hectares do atual campus, no Bairro Camobi.
Foto da maquete do Centro Politécnico, datada de 10.9.1959. O prédio "g" é o atual Centro de Tecnologia e o prédio "h" destinava-se ao Instituto de Arquitetura e Urbanismo, área de conhecimento que somente em 1992 foi instalada na UFSM. 

Bortolo Achutti
Nascido em Santa Maria, RS, em 28 de outubro de 1898, Bortolo Achutti era filho de Antonio Mansur Achutti, imigrante libanês, e de Magdalena Miolo Borin, imigrante italiana.
Apaixonado pela arte e técnica fotográfica, desde muito jovem ele começou a fotografar, realizando todos os procedimentos em seu próprio laboratório, ainda na casa de seus pais.
Bortolo Achutti - Recorte de foto com a
família, em meados da década de 1950.
Durante muitos anos, dedicou-se à farmácia, exercendo suas habilidades como laboratorista. Prestou prova de suficiência em Porto Alegre, sendo licenciado como farmacêutico prático.
Bortolo Achutti foi admitido, em 11.2.1953, como laboratorista, na Faculdade de Farmácia de Santa Maria, depois lotado no Curso de Medicina de Santa Maria, ambos então vinculados à UFRGS.
Desde os primórdios da UFSM e nas ações anteriores à sua criação, exerceu atividade como fotógrafo, registrando os eventos mais importantes da instituição. Também preparou material didático como diapositivos e colaborou em trabalhos científicos com ilustrações (micrografias e fotografias).
Foi membro da Comissão de Publicidade e fotógrafo-chefe do Departamento de Fotografia.
  No 12º aniversário da UFSM (1972), Bortolo Achutti recebeu a Medalha do Mérito Universitário, outorgada a professores e técnicos por suas contribuições à Instituição.
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Fontes:
Acervo pessoal
ACHUTTI, Aloyzio. Histórias que meu pai contava
BRENNER, José Antonio. Cursos de Engenharia do Centro de Tecnologia – Histórico resumido, In: Revista do Centro de Tecnologia-UFSM, vol. 13, nº 2, 1990.
http://www.cechella.com.br/luiza.htm

sábado, 6 de dezembro de 2014

Ennio Brenner – campeão

No ano de 1933, fatos importantes ocorreram no Avenida Tênis Clube. Houve a eleição da primeira rainha, foi composto o hino, realizado um festival beneficente e lançado o A.T.C., o primeiro jornal do clube. Na metade do ano, meu pai, Ennio Brenner, tornou-se campeão de tênis do A.T.C..
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   Meu pai, Ennio Brenner, era um apaixonado pelo tênis.
   Nascido em Santa Maria, em 18.3.1907, ele se associou ao Avenida Tênis Clube no início de 1926, quando ingressou em seu primeiro emprego, no Banco Pelotense, agência de Santa Maria.
Ennio aos 18 anos, quando
se associou ao A.T.C.
   Ainda não havia completado 19 anos, quando foi eleito 1º tesoureiro, em 14.3.1926, na diretoria sob a presidência de João Appel Lenz. Participou da gestão seguinte do clube (1927-28) como 1º secretário.
   O A.T.C. tinha sua sede na Praça do Mercado, atual Saturnino de Brito, onde Ennio encontrou Maria Luiza Brenner, sócia ateceana desde 1922, com quem se casou em 1930. Não eram parentes, ela pertencia a outra família Brenner de Santa Maria. Os genearcas de ambas as famílias vieram, em diferentes épocas, do Principado de Birkenfeld/Hunsrück. Minhas pesquisas genealógicas revelaram, porém, que houve um ancestral comum, no século XVII.


Maria Luiza Brenner, a caminho da
quadra de tênis da Villa Etelvina ~1922 
   Como a maioria das jovens ateceanas, Maria Luiza jogava por diversão, mas disputava o campeonato permanente, na 3ª divisão feminina. Jogava também na quadra de tênis da Villa Etelvina, no Pinhal (hoje Itaara), propriedade de sua tia Etelvina Brenner Ramos.

   O A.T.C. competia com clubes de várias cidades do interior, em torneios amistosos. Em 20 de setembro de 1927, quando jogou contra o Tênis Clube Santa Cruz, considerado o mais forte do interior, o A.T.C. venceu 5 dos 6 jogos disputados. Destacaram-se o então campeão Lamartine Souza  e Ennio Brenner que venceu o norte-americano Joe Harris por 6x2 e 6x3. Notícia no Diario do Interior comentou:

   Em pouco tempo, Ennio Brenner tornou-se vice-campeão ao vencer João Appel Lenz, no campeonato interno do A.T.C., em 1928.
   O jornal A.T.C., na edição nº 12, de 12.6.1934, inaugura com Ennio Brenner a seção Nossa gente... assinada por “Nícia”, um pseudônimo.
   Eis dois trechos:

   Se a cronista do tênis tivesse esperado mais um mês, poderia ter escrito que Ennio tornara-se o campeão do Avenida Tênis Clube.
  
Ennio, na inauguração do Brasil
Tênis Clube, de S. Gabriel, 23.4.1933.
Ao fundo, a Igreja S. José
 Campeão
   Foi no dia 9 de julho de 1933, um domingo invernal de frio intenso e sob gélido vento minuano, que      Ennio Brenner e Lamartine Souza enfrentaram-se no campeonato permanente, em jogo decisivo para definir a primeira posição, no ranking do A.T.C.

   O cronista que assinou “Soeu”, no Diario do Interior, destacou o jogo “entre os ‘veteranos’ Lamartine e Ennio, que terminou com a vitória deste por 6-3, 4-6 e 6-4.” 
Lamartine tinha 36 anos e jogava tênis desde o tempo em que era estudante de Medicina, em 1918, quando a quadra do A.T.C. estava na Av. Rio Branco. Ennio tinha 26 anos e começara a jogar havia sete anos.
   A seguir, o cronista descreveu “o interesse que despertou esse encontro entre os torcedores que tiveram o ensejo de apreciá-lo.”
 
   E comentou:



 No jornal A.T.C. de 25.2.1934, Lamartine Souza, em sua coluna Do tennis ..., escreve sobre  o revers ou backhand isto é, o golpe de revés. Após várias considerações técnicas, ele conclui citando Ennio Brenner e assinando “Ely Hesse”, pseudônimo que reproduzia o som de suas iniciais: L. S.

   

   1935
Ennio Brenner participou de várias diretorias do A.T.C., mas sempre recusou a presidência, quando esse cargo lhe era proposto. Seu interesse era o esporte, como atleta e como diretor esportivo, cargo que exerceu com entusiasmo e grande êxito, em várias gestões.
   Obteve marcante sucesso na abertura da temporada de tênis de 1935, o que lhe valeu, registrado em ata,  “um voto de louvor ao esforçado diretor esportivo, Sr. Ennio Brenner, pela maneira com que organizou,” salientando o registro que “ constitui uma nota inédita nos anais do tênis santa-mariense, de alguns anos para cá, a abertura da temporada de 1935.” A parte mais importante do programa foi o jogo das duplas Ennio e Flávio Paz contra Lamartine Souza e João da Costa Ribeiro, “a partida magistral que empolgou a assistência”. Venceu a dupla Ennio Brenner (28) e seu sobrinho Flavio Paz (17), chamado o “menino de ouro do tênis”, por 8x6, 3x6 e 7x5.
   Ennio Brenner e Lamartine Souza formavam uma dupla imbatível, nos torneios do interior.
Abertura da temporada do ATC, na Praça da República, em 24.3.1935.
João da Costa Ribeiro, Ennio Brenner, Flavio Paz e Lamartine Souza.
   Ennio manteve-se campeão do Avenida Tênis Clube até 1940, quando mudou-se para Santa Cruz do Sul, para assumir a gerência do Banrisul naquela cidade. Associou-se então ao Tênis Clube Santa Cruz.
   Em 26.10.1944, retornou a Santa Maria e ao Avenida Tênis Clube, participando da diretoria, principalmente como diretor esportivo, cargo que continuou a exercer mesmo após deixar o esporte, devido a uma hérnia abdominal, surgida em partida decisiva do torneio contra o Cruzeiro Tênis Clube, em Livramento. As equipes estavam empatadas e a simples entre Ennio e Joaquim Pereira de Sousa, presidente do Cruzeiro, era a última do torneio. Apesar das dores, Ennio venceu o longo jogo em 40 games, dando a vitória ao A.T.C.
   Na terça-feira seguinte, 18.5.1948, o jornal A Razão reportou que a “partida final foi a mais bela do torneio, tendo Ennio Brenner disputado uma das melhores de sua bonita carreira esportiva.” Comentou, a seguir, seu jogo admirável e um terceiro set disputado ponto a ponto, que se tornou sensacional para os torcedores. E concluiu:
Estava o Avenida Tênis Clube mais uma vez vitorioso, graças ao admirável esforço de um dos seus mais dignos defensores, Ennio Brenner, a quem novamente cabe o mérito de uma grande e vitoriosa jornada. Não fosse a excepcional resistência e sua fibra de veterano, estaríamos amargando o pó da derrota.
   Benemérito
   Aos 61 anos, afastado das lides esportivas, Ennio foi homenageado pelo Avenida Tênis Clube com o título de sócio benemérito, por resolução do Conselho Deliberativo, em 8 de janeiro de 1969, proposta pelo presidente do clube, Dr. Oyama Albuquerque de Carvalho.
   Consta no diploma que o título foi conferido "como testemunho de grande admiração de seus companheiros de Clube e pelos inestimáveis serviços prestados à Sociedade."

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Fontes:
Acervo pessoal.
Arquivo Histórico Municipal - Hemeroteca: coleções dos jornais Diario do Interior e A Razão.
Livro de atas nº 1 do A.T.C.